Celebra-se hoje o Dia Mundial da Saúde Mental cujo tema este ano é Saúde mental num mundo desigual. Foi publicado esta semana na revista Lancet um artigo sobre o impacto da pandemia na saúde mental global. Embora seja demasiado cedo para retirar conclusões definitivas, este estudo demonstra um aumento da prevalência da Perturbação Depressiva Major em quase 28% e um aumento de 26% nas Perturbações de Ansiedade. Além disso, as mulheres e os jovens foram os mais afetados. Quando olhamos para o mapa mundi, as regiões mais afetadas são o Norte de África e o Médio Oriente no caso da PDM e o Sudoeste Asiático no caso das Perturbações de Ansiedade.
Em todo o caso, antes da pandemia, já se estimava que existem cerca de mil milhões de pessoas em todo o mundo que têm doença mental, independentemente do local onde vivem, do estatuto social, da idade, do género. A depressão é a doença mais prevalente, estimando-se que cerca de 5% da população mundial tenha esta doença. Além disso, o suicídio representa 1 em cada 100 mortes.
Em Portugal, os números também são preocupantes, sendo o país com maior prevalência na UE de perturbações de ansiedade (cerca de 16,5%) e o terceiro na perturbação depressiva major (cerca de 7,9%).
Este ano o tema escolhido para este dia são as desigualdades no acesso aos serviços de saúde mental, o baixíssimo investimento público nas estruturas e recursos de saúde mental e estigma, descriminação e abuso dos direitos humanos de pessoas com doença mental. Além do mais, há um custo económico real da perda de produtividade. Mesmo com a recente implementação dos cuidados de saúde (mental) continuados, continuamos a ser um país cujo investimento é insuficiente, que perpetua a estigmatização da pessoa com doença mental e que não as protege com leis laborais justas.
Embora as doenças mais prevalentes, perturbações de ansiedade e perturbação depressiva major sejam tratáveis com medicação e psicoterapia, é necessário uma mudança de paradigma, que António Damásio explica muito bem. O Erro de Descartes, cujo paradigma vigora até aos nossos dias, é tratar corpo e mente como entidades diferentes.
A minha esperança é de que, num futuro próximo, não se fale em saúde mental, mas em Saúde. É que este equívoco, perpetuado na História, impede-nos de ver que o corpo humano funciona como um todo e só assim poderemos realmente cuidar da saúde.
LER DEVAGAR
Naturalmente, a minha sugestão será dos livros de António Damásio que, embora seja neurologista, dedicou grande parte da sua carreira à neuropsicologia. Se o leitor se interessa mais a fundo pela mente, recomendo os livros O erro de Descartes (Publicações Europa-América) e A estranha ordem das coisas (Círculo de Leitores). Para uma leitura mais leiga, o seu mais recente livro Sentir & Saber (Círculo de Leitores) expõe a sua teoria base de uma forma mais objetiva.
OUVIR COM CALMA
As saudades que nos deixa o grande Mestre António Coimbra de Matos, são mitigadas nesta a entrevista no programa É apenas fumaça.
VER NO SOFÁ
Quando penso em doença mental e na forma como é retratada no grande e pequeno ecrã, um filme e uma série ocorrem-me de imediato. Beautiful boy (Felix Van Groeningen), a história de um pai e um filho adolescente que lutam contra a dependência do rapaz. Um filme que expõe o estigma contra as pessoas com dependência e que nos mostram como a família também sofre mas pode simultaneamente ser um porto de abrigo.
Por último, a série Euphoria (HBO) traça um retrato assustador e revelador de um grupo de adolescentes numa escola americana. Não se trata só de dependências de droga e sexo, mas também das questões de identidade de género, pedofilia e a violência no namoro.