Kit de Sobrevivência II - George Addair
Sim, 2020 revelou-se um ano mais difícil do que muitos de nós esperava. Um milhão de pessoas perdeu a vida por causa de um vírus, um inimigo invisível. Milhões de pessoas ficaram sem emprego ou têm um trabalho tão precário que é mesmo só isso - trabalho. E nem vamos falar nos conflitos familiares, na violência doméstica, no abandono de animais, na desflorestação, na tensão política.
O meu desejo para 2020, aquele das doze badaladas, foi que a vida me trouxesse uma mudança profunda, que tudo o que conheço fosse abalado, que todos os meus valores fossem desafiados e que eu tivesse a coragem de enfrentar o meu maior medo: falhar.
Mas então, veio a pandemia e depois o confinamento, as distâncias sociais, a solidão, o desespero. Vi-me forçada a olhar para mim própria, para o mais fundo de mim, reconhecer-me como já não fazia desde os tempos da adolescência em que passava horas a ler e a pensar sobre o mundo. De repente, assim sozinha, vi-me obrigada a olhar bem para mim, ver o que gosto mais e o que não gosto tanto, a reconhecer que talvez tenha falhado aqui ou ali no meu caminho, porventura poderia ter ligado àquela amiga mais vezes, devia ter aparecido mais nos jantares de aniversário e sobretudo não devia ser tão exigente nem comigo nem com os outros. A vida é para ser vivida do lado do prazer, escreveu Freud (que também poderia ter sido o kit de sobrevivência de hoje). Mas sabem o que aprendi? Talvez falhar não seja assim tão perigoso, talvez seja mesmo necessário. Pois aqui me encontro a escrever, a enfrentar o meu maior MAIOR medo: falhar quando toda a gente está ver.
Por isso, alguns textos sairão melhor, outros nem tanto…alguns as pessoas gostarão mais do que outros, a vida é mesmo assim. Não me arrependo nem por um segundo, porque agora eu sei que do outro lado do meu medo está um mundo inteiro de possibilidades.