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O espaço das pequenas coisas

O espaço das pequenas coisas

02
Jun21

Kit de Sobrevivência XXXIV - Zadie Smith

KS XXXIV Zadie Smith.png

No tempo que passei em Inglaterra, uma amiga que lá vive há cinco anos, resumiu a sua experiência em Inglaterra da seguinte forma: “os ingleses são todos cheios de regras, nem sequer me olham nos olhos durante a semana. À sexta-feira vão para os bares embebedar-se e já são os meus melhores amigos.”

 

Claro que é uma generalização absoluta de um grupo restrito e algumas pessoas foram muito amáveis durante o tempo que passei lá. Guardo memórias maravilhosas do campo, do rio, dos animais, da Natureza inglesa do burburinho das cidades, da oferta cultural.

 

Quando era mais nova, no Algarve, porém, a história era diferente. Frequentemente vi o cenário descrito pela minha amiga, o que sempre me incomodou. Refleti melhor sobre o povo inglês e percebi que é, como provavelmente muitos países, uma nação de contrastes: o campo e a cidade, a riqueza do centro de Londres e bairros nos subúrbios, a nobreza e a imigração. Sente-se particularmente em Londres, as pessoas tensas, sempre atarefadas, contrastantes com o laissez-faire dos dias de Verão.

 

Quando era pequena, por vezes, o meu Pai levava-me ao estádio de futebol. Quando o novo estádio estava a ser construído lembro-me de ouvir o meu Pai debater com os amigos: “não vai haver redes para segurar adeptos! Vai ser só invasões de campo!” dizia um amigo do meu Pai; “não pá, vai ser como os ingleses, que quando tiveram condições melhores, sem barreiras, ajustaram o comportamento. Isso dos hooligans está a desaparecer…” respondia o meu Pai.

 

A verdade é que as imagens divulgadas infelizmente mostram o pior dos adeptos ingleses: sob todas aquelas regras, existe uma sociedade profundamente dividida, racista, xenófoba, como contam Zadie Smith nos seus livros e os Duques de Sussex nas várias  entrevistas  que concederam.

 

O aspeto talvez mais preocupante é o tabu da saúde mental. Numa sociedade tão reprimida, é difícil tratar a saúde como um todo, apesar de existirem vários programas interessantes com foco na intervenção precoce e no que chamam de “mental fitness”. Mas esta raiva demonstrada pelos adeptos é um sintoma de uma comunidade que precisa de ajuda.  

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